sábado, 17 de julho de 2010

Fome: um excerto



Eis um excerto de FOME de Elise Blackwell, que se encontra disponível em PDF no Press-Kit deste título. O livro está já à venda nas livrarias, além de nosso blogue e site.

"Os voluntários de opolchenia, incluindo a minha Alena mas não eu próprio, debandavam como ratos. Apareceram abrigos, e trincheiras. Mulheres jovens perfuravam as peles enrolando arame farpado em torno de obstáculos que impediam os tanques de penetrar na cidade. Todos esperámos pelo ataque e preparámo-nos para defender a nossa cidade quarteirão a quarteirão, edifício a edifício, mão a mão.

Mas os tanques nunca entraram. Pararam nos limites da cidade, e quão mais simples tudo teria sido se tivessem continuado.


Em inícios de Setembro, as primeiras bombas de Hitler desceram – graciosas, e diria até hesitantes, vindas do alto. Os aviões Junker subiam e desciam, subiam e desciam,
deixando para trás depósitos de bombas incendiárias tão semelhantes a silte letal. Quando atingiram os armazéns Badayev, as filas estreitas de edifícios de madeira arderam rápido, e as gorduras armazenadas nas suas provisões emitiam um calor vermelho, tornando o céu incandescente e enchendo o ar como cozinha de Verão.

Aquilo que não ardeu foram uns poucos milhares de toneladas de açúcar, que acabaram por se derreter através das tábuas de madeira do chão para sobreviver, moldados
e marcados pelas caves, como caramelo. Este caramelo era partido em pedaços valiosos e vendido por dinheiro e sexo nos meses que se seguiram. Mas muito mais iria circular e ser pago como comida. [...]

O aquecimento acabou em finais de Setembro, e todos os canos de Leninegrado congelaram. Até à chegada da neve, tínhamos apenas para lavagem a água lamacenta do
Neva, transportada à mão em baldes."

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