“Um mês mais tarde Ángel apareceu em enormes outdoors publicitários e nos ecrãs dos televisores. Passava trinta segundos cada vinte minutos em todos os canais e nas horas de maior audiência, sempre nos braços de um homem jovem e sorridente, um macho verdadeiramente interessante: o seu olhar expressava inteligência e sensibilidade. Ángel, gordinho e ufano, estava completamente nu. Nus estavam também o torso e os braços do homem. Braços muito bronzeados e musculados. Nos ante-braços só a penugem suficiente, a da virilidade. Ángel sorria, o homem sorria, e os dois inundavam o mundo de ternura. As mãos do homem revelavam força e benevolência, eram mãos que pareciam ter sido esculpidas por Rodin. Com a direita sustinha delicadamente a cabeça do bebé; na esquerda segurava um frasco de champô. O contraste era absoluto; a mensagem também. A pergunta evidenciava: ainda crês que não existem homens maternais? A continuação enunciava as bondades da linha de produtos de higiene para bebés.
Durante muitos dias Alícia e Rodrigo permaneceram fiéis ao ecrã de televisão. Durante muitos dias detiveram-se em frente dos painéis de publicidade das ruas para contemplar o enorme cartaz com o seu filhinho e o homem maternal. Rodrigo olhava fixamente para Ángel; Alícia passeava o olhar entre o seu bebé e o modelo que o sustinha nos braços.
Os familiares e os amigos do casal mostravam-se encantados: que riquezinha, Ángel, com essa carinha e esse rabinho ao léu! Toda a gente esperava vê-lo rapidamente noutro anúncio, mas passaram-se as semanas e os meses sem que a agência voltasse a requisitar a sua participação. O homem que o segurara nos braços continuava a aparecer na televisão: num spot encarnava um cliente de um banco; vestia fato e gravata e proclamava as vantagens de um determinado crédito hipotecário. Só aparecia quinze segundos, e não ia mal, mas Alícia gostara mais quando ele tinha feito de papá de Ángel. Não podia evitar compará-lo com Rodrigo, e de cada vez que os via juntos, pai e filho, ela desviava o olhar. Conheceu Rodrigo no bairro. Foram muito tempo simplesmente amigos até que por fim ficaram noivos. Alícia tinha uma amiga que se tinha casado com um norueguês; isso parecia muito interessante. Quase toda a gente se casava com gente das redondezas: pessoas do bairro, do trabalho ou da escola. Poucas, muito poucas raparigas se casavam com noruegueses: que ela soubesse, só a sua amiga. Unir-se a alguém diferente – ainda que não fosse norueguês – deveria ser uma aventura, pensava Alícia. Sempre que ouvia algum bolero saltavam-lhe essas ideias à cabeça. Os boleros agradavam-lhe.”
("O Outro Pai", in Buracos Negros de Lázaro Covadlo, tradução de F. J. Carvalho)
Subscrever:
Enviar feedback (Atom)
Sem comentários:
Enviar um comentário