quinta-feira, 7 de julho de 2011

Onde não há mercado, não há Acordo

(Adaptado de uma troca de opiniões no Facebook com o livreiro Sérgio Lavos)

Como em tudo, eu tendo a guiar-me não tanto pelo que é feito ou proposto (no caso, este Acordo Ortográfico), mas pela forma como é feito ou proposto. E este AO, negociado ainda em pleno cavaquismo, é uma prova da contínua falta de confiança nos referendos, na consulta, no escrutínio da população cuja vida e hábitos serão afectados pelo mesmo (a mesma coisa se passou com a entrada no Euro, com os resultados sabidos...). A questão é a do mercado: um suposto Acordo não vai resolver o simples problema de que entre nós e os outros países de expressão portuguesa, sobretudo o Brasil, não há um mercado cultural (no caso do livro, um mercado com envios postais mais baratos e uniformizados, com baixos impostos para os livros, com abatimento das barreiras alfandegárias, etc). Um mercado em que enviar um livro para o Brasil não custe um terço do seu PVP, obrigando à desistência dos leitores brasileiros interessados (falo por experiência: nunca tivemos um livro nosso recusado por leitores brasileiros pela sua ortografia, mas pelo custo dos portes, ou "fretes", de envio). Tivesse-se primeiro tratado da criação desse mercado da palavra impressa, e eu seria hoje um acérrimo defensor do AO.

Quando, há uns anos (estava eu na onda da ilusão de que se ia conseguir vender alguns livros a conta firme para livrarias brasileiras), um livreiro de uma das melhores livrarias do Rio (que até queria uns livros da Livros de Areia) me disse ao telefone que lhe ficava mais barato e preferia encomendar livros dos Estados Unidos do que de Portugal, fiquei definitivamente "vacinado" contra esta obsessão do AO. Sem resolver essa simples questão (uma editora portuguesa tem livros que quer vender, um livreiro ou leitor brasileiro tem interesse nesses livros, e o que está entre eles impede a satisfação de ambas as partes), receio bem que este Acordo não servirá de nada.
(PM)

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